Câncer ginecológico: 3º tumor mais comum entre brasileiras é cercado de desinformação

Embora seja o terceiro câncer mais prevalente entre mulheres, com 30 mil novos casos ao ano, falta conscientização entre a população, alertam entidades médicas

Câncer ginecológico
Foto: Freepik

Você sabia que o câncer ginecológico – isto é, colo de útero, endométrio, ovário, vagina e vulva – soma até 30 mil novos casos no Brasil todos os anos? Os dados são do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Embora esse grupo seja o terceiro câncer mais prevalente entre mulheres no país, sobra confusão – e falta conscientização – a respeito deles entre a população. Uma pesquisa recente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), feita em parceria com o Instituto Locomotiva e com o apoio da farmacêutica MSD, mostrou que 6 a cada 10 brasileiras não sabem que o papilomavírus humano (o popular HPV) é principal causa do câncer de colo útero.

Para chegar a esse resultado, os pesquisadores entrevistaram 831 mulheres, de 18 a 45 anos, de diferentes classes sociais, nas cinco regiões do país. Dados do Ministério da Saúde indicam que o câncer de colo de útero está por trás de 99% dos casos de câncer de colo de útero. Além disso, trata-se do câncer ginecológico mais prevalente na população – são 17 mil novos casos por ano no Brasil. “Não quer dizer que uma pessoa com HPV vai obrigatoriamente ter câncer um dia. Mas aquelas infectadas por grupos específicos desse vírus devem ser diagnosticadas e acompanhadas de perto”, esclarece a oncologista clínica Andrea Paiva Gadelha Guimarães, presidente do Grupo EVA.

A boa notícia é que, embora seja o mais comum, o câncer de colo de útero também é um dos mais simples de evitar. “Como é um vírus transmitido por via sexual, a primeira maneira de evitá-lo é com o uso de preservativo. A camisinha, entretanto, não previne todos os casos, uma vez que qualquer contato com secreções pela pele ou mucosas pode levar à infecção pelo HPV”, afirma. Por essa razão, a especialista ressalta que a vacina contra o HPV, disponível na rede pública para meninas e meninos de 9 a 14 anos, é uma das maneiras mais eficazes de combater o problema. Um estudo da Fiocruz, divulgado em outubro, mostrou que o HPV reduziu em 58% os casos de câncer de colo de útero e em 67% as lesões pré-cancerosas graves.

Conheça os principais tipos de câncer ginecológico

Entre os principais tipos de câncer ginecológico estão o de colo de útero, o de endométrio (também chamado de corpo de útero) e o de ovário. Embora pertençam à mesma região anatômica, de acordo com a oncologista clínica Angelica Nogueira Rodrigues, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), são doenças com carcinogênese (processo biológico que leva à formação do câncer) distintas.

O câncer de colo de útero, como já dito, está associado ao papilomavírus humano (HPV) em 99% das situações. “É mais comum em mulheres mais jovens, com uma média de idade de 47 anos. Daí a importância do rastreio, por meio do papanicolaou ou do exame DNA-HPV (que começou a ser implementado no SUS este ano) e da prevenção, por meio da vacinação”, pontua Rodrigues.

Já o câncer de endométrio, segundo a presidente da SBOC, tem origem hormonal. Por essa razão, é muito comum na pós-menopausa. Além disso, a obesidade é um fator de risco importante, uma vez que também impacta o equilíbrio hormonal (especialmente a produção de estrogênio). “O principal fator do câncer de ovário, por sua vez, é o histórico genético. Uma em cada quatro mulheres que apresenta esse tipo de câncer, ou seja, 25%, tem uma mutação genética que predispõe à doença. É um número muito alto comparado a outros tumores. Sendo assim, é um câncer com um peso hereditário grande”, resume.

Ao contrário dos tumores uterinos, que alteram o ciclo menstrual, o câncer de ovário é considerado silencioso. “Os sintomas, como distensão abdominal, alteração na urina e plenitude gástrica (sensação de estômago cheio), podem ser confundidos com outras doenças. O que atrasa o diagnóstico na maioria das pacientes, um fenômeno comum não apenas no Brasil, como em outros países”, lamenta a oncologista Angelica Nogueira Rodrigues.

De acordo com a especialista, tais diferenças entre os três tipos de câncer ginecológicos mais prevalentes na população são um obstáculo em termos epidemiológicos e podem dificultar a implementação de medidas de saúde pública.

Combate à desinformação

O primeiro passo para aprimorar o combate ao câncer ginecológico, de acordo com as especialistas ouvidas pela IstoÉ, é a conscientização. O estudo realizado pelo Grupo EVA revelou que muitas participantes possuíam informações equivocadas sobre a doença. “Um exemplo é a crença de que a vacina poderia estimular a atividade sexual precoce. Isso não faz sentido, já que o imunizante contra a hepatite B (também uma doença sexualmente transmissível) é aplicado logo após o nascimento”, explica a oncologista Andrea Paiva Gadelha Guimarães, presidente do Grupo EVA.

Outro desafio importante é a baixa adesão ao exame papanicolau. Dados da Agência Brasil mostram que, entre 2021 e 2023, apenas três estados atingiram cobertura próxima de 50% do público-alvo. “O papanicolau existe há meio século, mas ainda não conseguiu reduzir significativamente a mortalidade desse tipo de câncer. Embora cada região do país apresente suas particularidades, tanto os exames de rastreamento quanto as vacinas estão disponíveis gratuitamente nos postos de saúde”, destaca a oncologista Angelica Nogueira Rodrigues, da SBOC. “Por isso, é fundamental que a comunicação seja ampla, utilizando diferentes meios e alcançando diversos públicos”, complementa Andrea.