FOFO: entenda o medo do diagnóstico que afasta pacientes do consultório

ermo descreve a esquiva de exames e diagnósticos por receio do resultado; especialistas alertam que a paralisia emocional agrava doenças e sobrecarrega o sistema de saúde

Paciente conversa com médica
Foto: Freepik

A sigla em inglês FOMO (fear of missing out), o medo de perder algo, ganhou certa popularidade e, embora tenha sido originado em comunidades online, passou a fazer parte da linguagem e já foi até assunto de pesquisas. Agora, um termo parecido, mas menos conhecido, começa a ganhar destaque em consultórios médicos e na psicologia, o FOFO ou “fear of finding out”. Traduzindo, seria algo como “medo de descobrir”, em relação a diagnóstico.

A expressão descreve o comportamento de quem costuma se esquivar de exames, consultas e retornos por receio de encontrar uma doença. Dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2025, apontam que mais de 70% dos brasileiros não realizam check-ups regularmente. Ao que tudo indica, mesmo que a sigla não seja tão famosa, o FOFO encontra exemplos de sobra por aqui. Na prática, esse comportamento pode atrasar diagnósticos e agravar doenças que teriam tratamento simples se detectadas cedo.

Para o médico Arthur Fernandes, diretor do Departamento de Comunicação da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), os pacientes frequentemente evitam completar exames solicitados. “Isso ocorre por falta de compreensão sobre a doença, dúvidas sobre a explicação do profissional ou medo do exame”, diz, em entrevista a IstoÉ.

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Ele separa os tipos de receio em dois grupos, um que é relacionado a exames preventivos, como mamografia ou colonoscopia, e outro, que é mais ligado à investigação de sintomas já existentes. Em ambos os casos, as consequências podem ser graves. “Quando o rastreamento é ignorado, cresce o risco de uma lesão pequena passar despercebida e ser descoberta já maior ou mais grave”, explica.

Em outra situação, é possível que uma mulher que já tenha um nódulo na mama, por exemplo, receba um pedido de biópsia e adie a realização do exame por medo de descobrir que de fato tem um câncer. Isso, é claro, vale para outras condições e impacta a saúde pública, porque o sistema de saúde precisará lidar com pessoas com doenças mais avançadas ou graves, por vezes com menor possibilidade de tratamentos e com maior custo, tanto emocional quanto econômico”, acrescenta.

Quem procura acha?

A psicóloga Marina Vasconcellos, psicodramatista e terapeuta familiar e de casal pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), explica que o FOFO é, antes de tudo, uma tentativa de se proteger emocionalmente. “É justamente isso: uma autoproteção.

Não quero saber, não tenho como lidar, é pesado para mim, então vou deixar quieto’. Tem gente que até sabe, no fundo, o que tem, mas não quer enfrentar o sofrimento de um tratamento difícil e doloroso”, descreve. Segundo ela, isso é especialmente comum nos diagnósticos mais temidos, como câncer.

Esse comportamento, porém, impacta não apenas o paciente, mas também familiares, que muitas vezes se sentem impotentes e angustiados quando a pessoa, mesmo com sintomas, se recusa a buscar ajuda.

Tanto na psicologia quanto na prática médica, há o consenso de que a fantasia sobre o pior cenário costuma ser mais angustiante do que a realidade. “A imaginação se torna um inimigo poderoso. A fantasia não tem limite. A realidade tem. Enquanto você não sabe, pode viajar na imaginação, sempre esperando o pior. Quando recebe o diagnóstico, para de inventar histórias e pode agir. Isso reduz muito a ansiedade”, afirma a psicóloga.

Ao evitar os exames por medo de confirmar algum diagnóstico, cresce o risco de descobrir a doença tarde demais. “Então, valida-se a crença de que ‘não tinha mais o que fazer’, quando, na verdade, o atraso é que prejudicou o tratamento”, aponta Marina. A intenção de se proteger, nesse caso, pode virar um obstáculo.

O papel do profissional de saúde e da família

Infelizmente, não é incomum ver médicos dando bronca ou dizendo, por exemplo, que os pacientes são irresponsáveis. Além de não ajudar, esse tipo de posição acaba afastando ainda mais e ampliando o problema. “O médico precisa explicar possibilidades, mostrar que só com exames é possível ter certeza do que está ocorrendo e oferecer ajuda real”, destaca a psicóloga.

Para o médico Arthur Fernandes, a abordagem ideal para reconhecer e lidar com um paciente que apresenta o FOFO combina técnica e empatia. A situação é tão comum, que a área da Medicina de Família e Comunidade tem um protocolo de apoio tradicional para isso, o Método Clínico Centrado na Pessoa (MCCP). “Com o MCCP, entendemos a visão da pessoa sobre sua doença, seu contexto social e familiar, e construímos um plano conjunto. O vínculo fortalece a confiança e melhora a adesão”, explica o especialista.

Nesse cenário, a família também representa um papel importante. “O acolhimento é essencial: ir junto (às consultas ou exames), oferecer apoio, conversar sem julgamento”, completa a psicóloga.

Para ambos os especialistas, enfrentar o FOFO não é apenas uma questão técnica, mas emocional e humana. Significa reconhecer que o diagnóstico, mesmo difícil, abre portas para a ação. A dúvida, por outro lado, paralisa.

Estratégias para superar o FOFO

1. Organizar o medo – Escrever o que está sentindo, quais os sintomas, quais são os medos e o que impede de buscar ajuda concretiza as questões. Assim, a necessidade de ação pode ficar mais clara.

2. Conversar com alguém de confiança – Compartilhar o conteúdo escrito ou mesmo apenas conversar com uma pessoa querida pode trazer alívio e clareza.

3. Buscar apoio emocional – Se o medo é muito grande, a terapia pode ser recomendada.

4. Ir acompanhado ao médico – O medo diminui quando alguém oferece apoio concreto: ir junto, ajudar a marcar, acompanhar no dia.

6. Lembrar que a fantasia é sempre pior – A incerteza é angustiante. A imaginação cria monstros. A realidade, mesmo difícil, é tratável.