Nos últimos anos, uma onda de produtos proteicos começou a dominar as prateleiras dos mercados. Não é difícil encontrar o nutriente em todos os tipos de produtos, como farinhas, barrinhas, iogurtes, sopas e até mesmo sorvetes. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres (Abiad), a ingestão de whey protein aumentou 25% entre 2021 e 2023. Já um levantamento da Mordor Intelligence, empresa de pesquisa de mercado, mostrou que o mercado global de proteínas movimentou cerca de US$ 24 bilhões em 2024, número que deve chegar a US$ 32 bilhões até 2029.
Para a chef de cozinha Luciane Recco, o crescimento de tais produtos vêm sendo impulsionado por uma maior conscientização do público sobre saúde e nutrição. “As pessoas buscam cada vez mais produtos que fazem essa junção de sabor, praticidade e benefícios reais ao organismo”, conta a CEO do Lyfe, um dos maiores grupos de alimentação saudável do país. Para acompanhar a demanda, em junho deste ano, a empresa lançou o sorvete Super Soft, que além de proteico, não tem açúcar, glúten e polióis (carboidratos usados como adoçantes).
O médico nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrição (Abran), também credita o boom de produtos proteicos à praticidade. “Especialmente para pessoas que praticam atividades físicas e precisam atingir a ingestão de uma certa quantidade de proteína por dia”, afirma. Mas será que todo mundo precisa mesmo comer tanta proteína? Qual a função dela no organismo, além dos “desejados” músculos? Onde encontrá-la de forma natural? A seguir, especialistas em nutrição respondem às principais dúvidas sobre o tema.
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A função da proteína no organismo
Ter um estoque de proteína fácil e rápido pode ser útil, afinal, as proteínas são macronutrientes essenciais para o funcionamento e saúde do organismo. Elas atuam na construção e reparo de tecidos, na defesa do organismo, repõem a energia perdida, auxiliam no ganho de massa magra e regulam processos metabólicos.
Na natureza, a proteína pode ser encontrada nos seguintes alimentos:
Carne bovina
Carne suína
Frango
Ovos
Peixe
Leite e derivados
Grãos como feijão, grão de bico e lentilha
Soja e derivados
Apesar dos benefícios destacados por influenciadores fitness e pela indústria, especialmente em relação ao ganho de massa muscular, vale lembrar que a proteína não vai garantir esses resultados sozinha. É preciso de uma alimentação saudável de modo geral, acompanhada de uma rotina de exercícios físicos.
Quem precisa de suplementação?
A importância da proteína no organismo é inegável, mas ela não é a única protagonista de uma alimentação saudável, como alerta o nutrólogo da Abran, Durval Ribas Filho: “nós precisamos da proteína, mas também de carboidratos, gorduras, vitaminas, minerais e água para ter uma alimentação saudável”.
No geral, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a ingestão de 0,8g a 1g de proteína por quilo de peso corporal para suprir necessidades fisiológicas diárias desse nutriente. Isso significa que um adulto de 70kg, precisaria de cerca de 56g a 70g de proteína por dia – sendo que 56g equivalem, em média, a 2 ovos grandes, 1 filé de frango, 1 copo de iogurte natural, 1 punhado de castanhas e uma fatia de queijo, por exemplo.
Essa quantidade pode ser alcançada com uma alimentação balanceada, segundo a nutricionista do programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), Mariana Ribeiro: “diversos estudos mostram que as refeições tradicionais brasileiras têm todos os grupos alimentares, assim como os nutrientes necessários, inclusive a proteína”.
No Brasil, o consumo de proteína, aliás, é até mesmo mais elevado do que o recomendado, como mostrou um estudo recente feito pela Universidade de São Paulo, em parceria com outras instituições. Publicada na Revista de Saúde Pública, a pesquisa mostrou que a média do consumo brasileiro de proteína chega a 18% do teor energético diário, inclusive nas faixas de renda mais baixas, sendo que a recomendação da OMS é de 10% a 15%.
Por essa razão, de modo geral, a suplementação de proteína é indicada em casos específicos, como para atletas ou praticantes regulares de atividade física. “Enquanto o consumo médio da proteína é de 0,8g por quilo, no caso dos atletas essa média pode chegar até 2,2g por quilo”, explica o nutrólogo Durval Ribas Filho. Outro caso específico importante é o de pessoas com déficit desse nutriente, característica pouco comum na população, como destacou o estudo da USP.
Atenção ao rótulo dos produtos proteicos
Um estudo recente do Idec observou que a onda de alimentos proteicos pode induzir o consumidor a acreditar que está fazendo uma escolha alimentar mais saudável. “Um produto com a adição de proteína, entretanto, não é necessariamente sinônimo de um alimento saudável, especialmente se for ultraprocessado”, afirma a nutricionista do Idec, Mariana Ribeiro. Além dos riscos associados à ingestão excessiva de ultraprocessados, como diabetes e doenças cardiovasculares, o produto escolhido pode não apresentar tantas vantagens.
“Alimentos que têm proteínas naturalmente, como ovos, leite e carnes, têm outros compostos que complementam aquele nutriente, como fibras, vitaminas e minerais. Nos ultraprocessados, o nutriente é adicionado de forma isolada e assim o produto tem uma qualidade nutricional inferior aos naturais”, explica Mariana Ribeiro.
Para fazer uma escolha mais consciente, a nutricionista do Idec aconselha os consumidores a olhar os rótulos dos produtos: “muitos exaltam uma grande quantidade de proteína, mas quando você lê a lista de ingredientes, há também aditivos e outros componentes que não são benéficos para a saúde”. Outra alternativa é buscar atingir as metas de proteína com uma variedade maior de fontes naturais ou minimamente processadas, que devem ser distribuídas ao longo das três refeições diárias principais.
E comer proteína demais, faz mal? De acordo com o nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Abran, sim. “A ingestão exagerada de proteína pode não ser metabolizada adequadamente, aumentando o ácido úrico e o risco de cálculos renais, além de causar desidratação”, alerta. Por isso, os especialistas consultados por IstoÉ reforçam que a chave está no equilíbrio e na qualidade das escolhas.