Com o Natal se aproximando, muitas crianças já colocaram um celular na lista de presentes. Ceder ao pedido pode ser tentador, mas uma pesquisa divulgada esta semana alerta para que os pais e responsáveis de crianças de até 12 anos de idade pensem duas vezes antes de entregar um dispositivo à criança.
Segundo o estudo, divulgado na revista científica Pediatrics, da Academia Americana de Pediatria, crianças que tinham um smartphone aos 12 anos corriam maior risco de depressão, obesidade e sono insuficiente do que aquelas que ainda não eram donas do aparelho.
O estudo mostrou ainda, que quanto mais jovens as crianças eram quando receberam seus primeiros smartphones, maior era o risco de obesidade e sono inadequado. Para chegar a tais conclusões, foram analisados dados de mais de 10.500 crianças que participaram do “Adolescent Brain Cognitive Development Study” (Estudo de Desenvolvimento Cognitivo do Cérebro Adolescente, em tradução livre), a maior pesquisa de longo prazo sobre o desenvolvimento cerebral de crianças nos Estados Unidos até o momento.
Segundo os pesquisadores, o estudo mostra apenas uma associação entre ter um celular na infância e piores indicadores de saúde, não uma relação de causa e consequência. E não tem o objetivo de culpabilizar os pais, apenas de ressaltar que a idade faz diferença.
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Para o psicólogo Rodrigo Nejm, coordenador do Eixo Digital, do Instituto Alana, o problema é quando as crianças se afastam do mundo real. “Quando as crianças estão consumindo mídias digitais, elas estão deixando de fazer as outras coisas, como dormir integralmente no período da noite, interagir presencialmente com outras crianças, brincar, praticar esportes. A principal preocupação é o que esse tempo de celular tem tirado em termos de experiências dessa criança”, alerta Nejm, que também é e especialista em educação digital.
No Brasil, o Ministério da Saúde também preconiza que as crianças não tenham smartphones próprios antes de completar 12 anos. Apesar disso, 55% das crianças brasileiras de 9 a 10 anos já têm um celular, segundo dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2025, que analisa o comportamento digital na infância e adolescência.
Diante deste cenário, organizações sociais, como o Movimento Desconecta, adotam uma postura mais restrita, defendendo que o primeiro celular seja dado a partir dos 14 anos e o acesso às redes sociais a partir dos 16.
“Nós criamos um movimento que tem se espalhado por várias escolas do Brasil, no sentido de unir os pais para que eles tenham esse acordo coletivo de adiar a entrega do celular. Assim, a gente protege as crianças dos riscos das redes e da exclusão, da criança não ser a única sem celular”, explica Fernanda Machado, uma das fundadoras do Movimento Desconecta.
A seguir, veja cinco dicas de como adiar a entrega do celular para os filhos ou restringir o acesso, caso a criança já tenha o aparelho.
Converse sobre regras
A principal dica para adiar ou limitar o uso de celular é dialogar com as crianças sobre os motivos. “Nós percebemos que quando as regras e limitações são conversadas em casa, as crianças têm uma aceitação maior”, explica Fernanda Machado, do Movimento Desconecta.
Segundo o especialista em educação digital, Rodrigo Nejm, além de ser firme, é necessário explicar as regras de uma maneira que a criança entenda: “os pais precisam recuperar a autoridade e mostrar que retirar ou limitar o uso do celular é uma medida de proteção”, afirma.
Uma forma de começar a conversa é usando situações práticas: “eu sempre dou o exemplo da cidade: pergunte para o seu filho se ele gostaria de ser deixado sozinho no bairro mais perigoso da sua região por algumas horas. Na internet, a lógica é a mesma”, exemplifica Rodrigo Nejm.
Além disso, cabe aos adultos definir horários específicos, seguir as classificações indicativas e usar as ferramentas de controle parental.
Mude as configurações do aparelho
Nas configurações dos telefones, é possível configurar o sistema operacional de acordo com a idade do usuário. Com esse ajuste, além de limitar o tipo de acesso da criança, só serão instalados aplicativos que tenham classificação indicativa apropriada para a faixa etária.
Existem ainda as ferramentas de controle parental, que possibilitam aos pais diminuir a quantidade de notificações, configurar a quantidade de horas de navegação por dia, bloquear aplicativos específicos e proteger os dados das crianças.
Uma nova lei sancionada em setembro deste ano, a ECA Digital, deve facilitar esse trabalho para os pais. Ela estabelece que as empresas responsáveis por redes sociais, aplicativos, jogos e plataformas de streaming sejam responsáveis por fazer a verificação de idade e adotar outras medidas para proteger as crianças. A previsão é de que a lei entre em vigor em março do ano que vem.
Envolva a sua comunidade
Outra medida é envolver a família, a comunidade escolar e demais pessoas ao seu redor, transformando-se em exemplo, como explica Fernanda Machado, do Movimento Desconecta: “nós, adultos, também estamos viciados e sendo impactados o tempo todo pelo celular. Então também precisamos nos conscientizar e deixar o aparelho de lado nas refeições, evitar ficar nas redes perto das crianças e desligar as notificações, quando possível”.
Tire o celular do quarto durante a noite
Para minimizar o uso excessivo do celular no período da noite, retire os aparelhos eletrônicos do quarto. Não apenas o da criança, como o dos adultos também. Além de evitar o acesso à internet sem supervisão, a medida favorece a qualidade do sono.
Ofereça outras atividades
Uma última dica fundamental é pensar na vida offline das crianças, segundo o especialista em educação digital do Instituto Alana “Muitas vezes, as crianças não têm tempo de qualidade com pais, mães, avós e amigos. A questão é que esses momentos sem telas são essenciais para criar vínculos afetivos, conforto emocional e habilidades para lidar com as frustrações e o tédio, assim como estimular a criatividade”, finaliza.